[PSL-Brasil] Onde está o movimento brasileiro do software livre? (Re: MiniCom...)

Hudson Flavio Meneses Lacerda hfmlacerda em yahoo.com.br
Sábado Junho 8 17:45:01 BRT 2013


Cláudio Sampaio wrote:
> Nem todo mundo se sensibiliza pela causa das liberdades de softwares e
> direitos digitais, infelizmente. Algumas, provavelmente, por não
> conseguirem ver com clareza as consequências dessas causas.

Oi Patola,

Eu diria que quase totalidade não vê absolutamente nada. As pessoas não 
têm a mínima noção de como funciona, por exemplo, o correio eletrônico 
ou o acesso a uma página de internet. (Eu também não sei quase nada 
sobre isso, mas sei o suficiente pra configurar navegadores e o 
firestarter.)


> Então, nessas
> horas, mais que apelar para longínquos princípios incompreensíveis para a
> maioria das pessoas, mais vale apontar problemas práticos mais próximos ao
> cotidiano delas.  E nesse sentido, o pessoal do Facebook tem "colaborado",
> tornando-o cada vez menos usável; além de interface irritante e carregada,
> ultimamente, para capitalizar (ou no jargão atual anglicista: "monetizar"),
> eles criaram os assim chamados "post promovidos", em que você faz
> micropagamentos para que seu post chegue ao mural de todos os seus
> contatos. A consequência disso é que se você *não* paga, seu post só é
> visto por uns gatos pingados.

Por isso digo que a questão não é técnica, é política. Mas o problema 
dessa abordagem é que se surgir algo mais "usável", que não seja 
"irritante" ou "carregado", as pessoas vão achar que faz sentido mudar 
para lá, mesmo que seja algo ainda mais perverso que o Facebook ou o 
Google. É o que está acontecendo, por exemplo, com aquele backdoor 
chamado Google Chrome, que está se difundindo e tirando usuários do 
Firefox. A abordagem de recursos técnicos tem que ser secundária, como 
argumentação suplementar, não pode ser o foco da mensagem. Exemplos de 
abusos não faltam para a abordagem política.

Os problemas práticos mais relevantes são invasões, abusos, espionagem, 
software fora de controle dos usuários, spyPhones que fazem gravações, 
fotos e vídeos à revelia dos usuários, dados em mãos de terceiros, 
tráfico de informações pessoais, eleições infiscalizáveis, etc.

A parte mais difícil é que, como você já disse, cada um desses temas -- 
que são os que realmente importam -- é complicado de explicar e 
entender. O que a sociedade precisa é de uma formação tecnológica 
disponível a todos desde a infância, para poder entender e se defender 
desses abusos.

>
> Mas as pessoas *querem* uma rede social. Não adianta.

Esse não é nenhum problema. É legítimo que queiram e usem. Mas elas 
precisam saber dos altos custos de algumas dessas redes.


> Então como até agora
> o Google Plus tem sido menos censurador e menos "caça-níqueis" que o
> Facebook, tenho chamado as pessoas para lá.

Acho isso triste. Seria melhor puxar para Diaspora* ou algum outro meio.

Pelo menos, as pessoas precisam saber que não devem usar serviços 
pessoais do Google no mesmo navegador que usam para outros sítios e 
outros serviços do Google.


>
> Eu mesmo fiquei muito dependente da funcionalidade de uma rede social.
> Consegui contatos preciosos, e informações que têm me enriquecido muito.

Não vejo problemas em redes sociais em princípio. Não tenho interesse 
nelas porque minha personalidade não é muito sociável.

>
>   Não é muito legal a situação em que nos encontramos, mas acho que meio que
>>> inevitável. Quem ganha algum poder acaba o usando pra algo. E o poder de
>>> agregação de comunidades é algo muito potente.
>>>
>>>   Você vê nisso algo similar ao uso temporário de Unix pelo RMS para
>> iniciar o GNU? Ou como motins no interior de uma prisão perpétua?
>>
>
> Minha visão é pessimista, acho que está mais pro lado da prisão perpétua.

Suspeitei. Também não sou otimista.


> Vejo a funcionalidade de rede social como inevitável (as pessoas querem) e
> vejo como únicos controladores eficientes delas empresas privadas como
> Facebook e Google. Eu também meio que não sei "pra onde ir", visto que,
> concordo, o Google tem tomada atitudes abertamente malignas ultimamente. :(

Pelo menos desde 2003 o Google has been very evil.

>
> Ah, Netflix: é um serviço de streaming de vídeo que funciona de modo
> parecido a uma televisão a cabo, com bastante conteúdo - inclusive conteúdo
> original da própria empresa - e assinatura mensal barata. Tem tomado a
> internet de assalto e erodido de forma bastante violenta o lucro das
> operadoras de tevê a cabo. As pessoas vêem Netflix como uma "alforria" da
> tevê a cabo, sem perceberem que estão entrando em uma prisão talvez até
> maior (ainda que mais barata) que envolve o sequestro de seus computadores
> para fazer operações que são contra o seu interesse (o DRM).

Serviços de TV digital remotamente monitorada (e.g. TV a cabo) também 
são um outro tipo de coisa completamente inadmissível para mim.

Isso me fez lembrar um ponto crucial desses desserviços todos que 
estamos criticando: o usuário não paga porque não é o cliente, é a 
mercadoria. Aí está o talvez o maior de todos os problemas de 
dependência desses desserviços, a maior dificuldade de compabê-los: 
trata-se de atividades que têm um custo de manutenção, mas alternativas 
honestas não conseguem vingar, tendo de concorrer com esses atrativos 
"gratuitos".


>
> Isso é inclusive algo que ninguém menos que Bruce Perens disse numa
> entrevista não-tão-recente[1]. O usuário não-técnico, ou mesmo desligado de
> tendências e ideologias, tem rejeição ao discurso das liberdades de
> software e direitos digitais porque lhe parece algo que confrontará outras
> "liberdades" que a indústria lhe deu.

Essa visão não deveria ser acatada, mas combatida, mesmo que pareça 
batalha perdida. Vou dar uma olhada na entrevista.


> Para nós, um iPhone é um dispositivo
> o mais fechado e ultrajante possível, mas com ele veio, para este usuário,
> uma facilidade imprecedente, uma "liberdade" da complicação técnica e
> "feitiços inextrincáveis" antes acessíveis apenas a aqueles nerds de óculos
> sem habilidades sociais. Algo cheio de DRM, patentes, segredos industriais,
> EULAs draconianos e demais desrespeitos pode ainda assim parecer
> brilhantemente liberador para uma pessoa comum, e de certo modo, é. Nosso
> discurso deveria mudar para abordar isso.
>
> [1]
> http://news.slashdot.org/story/12/11/05/0122238/bruce-perens-answers-your-questions
>

Mudar de onde para onde?

Eu, pessoalmente, não posso fazer um discurso que amenize problemas que 
eu considero altamente repugnantes -- seria desonesto, inclusive comigo 
mesmo. Minha inquietação atual se deve justamente a ter ficado calado 
por muito tempo frente a situações repugnantes, apenas por buscar 
tolerar a ignorância alheia como algo "aceitável" por estar na moda, 
evitar ser muito radical. (As atitudes "radicais" mantenho firmemente 
quanto a minha própria vida.)

De qualquer modo, penso que a simultaneidade de abordagens diferentes 
pode ser positiva, porque alcança contextos que uma abordagem rígida e 
una não alcançaria -- uma visão darwiniana. Por exemplo, não é um 
fracasso total para o software livre a existência da "open source 
initiative" -- atrapalha bastante por um lado, mas tem alguns resultados 
positivos por outro, que podem ser aproveitados. Então, acho importante 
que exista tanto a visão "radical", "extremista", quando outras 
"neo-pós-modernistas-pero-no-mucho-y-al-revés". Autenticidade é essencial.


Valeu pelas informações!

Até mais,
Hudson



More information about the psl-brasil mailing list