[PSL-Brasil] Por um FLISOL Exemplar

Alexandre Oliva lxoliva em fsfla.org
Terça Março 24 00:00:12 BRT 2015


A premissa fundamental do Movimento Software Livre é a de que software
privativo de liberdade é um poder injusto que subjuga seus usuários.
Nossa estratégia para resolver esse problema social é informar,
conscientizar e inspirar usuários para resistir a esse subjugo,
rejeitando software privativo de liberdade, para que essas linhas de
negócios deixem de ser atraentes e deixem de fazer vítimas.

Para formar resistência suficiente, precisamos difundir os valores,
princípios, objetivos e estratégias do Movimento Software Livre.
Objetivos e estratégias podem até ser ensinados e aprendidos com
palavras: manifestos, artigos, palestras e debates.  Mas para ensinar
e aprender valores e princípios, exemplos falam muitíssimo mais alto
que palavras.  Com que exemplos o FLISOL da sua cidade vai ensinar os
valores e princípios do Software Livre?

Um visitante que tenha levado seu computador a uma sede do Festival
Latinoamericano de Instalação de Software Livre, para experimentar
Software Livre, pode assistir ou não às palestras, mas seguramente
espera sair do evento com Software Livre instalado no computador.  Não
necessariamente GNU/Linux-libre, pois há outros sistemas operacionais
Livres, nem mesmo um sistema operacional, pois o que normalmente
importa aos usuários são os aplicativos.  Cumpre a nós, do Movimento
Software Livre, utilizar essa oportunidade para, além de instalar
Software Livre na máquina, preparar o usuário para nos ajudar na
resistência ao software privativo de liberdade, compartilhando as
ideias do movimento.  Essencial para que isso funcione é se comportar
de modo compatível, pois palavras ensinam valores menos que o exemplo.

As mais populares distribuições de GNU/Linux não estão alinhadas com o
Movimento Software Livre, pois oferecem e instalam software privativo
de liberdade.  O problema mais comum são controladores privativos
(drivers ou firmware) para componentes de hardware com especificações
secretas.  Os fabricantes desses componentes pretendem mantê-los
incompatíveis com a liberdade do usuário, dificultando o
desenvolvimento de Software Livre que cumpra função equivalente.

Informar usuários sobre essa incompatibilidade é essencial, para que
melhor compreendam a raiz e origem do problema e possam levar isso em
conta quando forem comprar seu próximo computador.  Certamente
instalar uma distribuição que busca esconder esses problemas dos
usuários não ajuda a informá-los, por isso mesmo parabenizo a
iniciativa da petição para que o FLISOL deixe de instalar Ubuntu, bem
como a adoção de recomendação nesse sentido pela coordenação nacional
brasileira e por várias sedes.  Começar por reduzir a maior
transgressão é um ótimo primeiro passo!  Mas não chega a resolver o
problema de coerência do FLISOL com o Movimento Software Livre.

Para um novo usuário, a instalação de uma distribuição 100% Livre pode
muito bem funcionar 100%, mas do contrário abrirá caminho para
explicar o problema do hardware incompatível com a liberdade.  É óbvio
que a notícia da incompatibilidade será desapontadora para muitos
visitantes, e muitos instaladores podem ficar de coração apertado se
não "ajudarem" o visitante a instalar blobs e drivers privativos de
liberdade exigidos pelo hardware, ou plugins "necessários" para que
distribuidores de obras autorais de entretenimento tomem o controle do
computador do visitante.  São dilemas sem solução favorável: é preciso
decidir entre comunicar que algum software privativo de liberdade é
aceitável e até desejável, ou arriscar afastar um usuário ao mostrar a
importância da resistência firme ao software privativo de liberdade.

Se uma oferta para instalar aplicativos Livres no sistema operacional
privativo já instalado não empolgar, orientação sobre as
possibilidades de substituir os componentes incompatíveis pode ajudar
um pouco e dar um bom exemplo da importância da resistência.  Por
outro lado, oferecer software privativo de liberdade para fazer o
componente funcionar pode até parecer ajudar mais, mas transmite
exatamente a mensagem contrária à necessária para formar a resistência
ao software privativo de liberdade.  Mesmo uma visível hesitação pode
parecer descaso ou hipocrisia se a ação contrariar os princípios.

Afinal, se instalar software privativo em quantidades cada vez maiores
fosse a solução do problema de componentes de hardware incompatíveis
com a liberdade, por que parar no firmware, ou nos drivers?  Num
computador com Boot Restrito, daqueles que impedem a iniciação de
sistemas operacionais alternativos, o software privativo necessário
para fazer um GNU/Linux funcionar é o Windows, inteiramente privativo,
e um ambiente de execução de máquinas virtuais, igualmente privativo.

Mas ninguém (além da própria Microsoft, suponho) pensaria em instalar
Windows num festival de instalação de Software Livre.  Por que, então,
instalam-se tantos outros programas privativos no FLISOL?  Não são
eticamente melhores que o Windows!  O receio de que, sem eles, o
usuário volte ao software privativo é medo d'"A volta dos que não
foram": usando GNU/Linux com blobs, o usuário jamais terá deixado a
escravidão do software privativo de liberdade, no máximo terá mudado
de feitor.  Na liberdade, como na segurança, é o elo mais fraco da
corrente que se rompe e põe tudo a perder.

Uma conversa franca e honesta com o usuário fará muito mais pelo
Movimento Software Livre que instalar uma distribuição com componentes
privativos, ou mesmo que instalar uma distribuição 100% Livre que não
funcione bem no computador incompatível.  Afinal, o visitante
seguramente poderá encontrar na Internet receitas para instalar o
software privativo de liberdade que fará o componente funcionar.
Porém, graças às ideias da conversa e ao bom exemplo observado,
entenderá que sua decisão é pessoal, que ninguém deve tomá-la em seu
lugar, e que trata-se apenas de um sacrifício temporário de sua
própria liberdade, até que uma solução esteja ao seu alcance.  Bons
exemplos, conselhos e ideias ajudarão a manter o usuário no caminho
para a liberdade, mesmo que seja longo e árduo.

Mas se, ao invés de receber um exemplo firme e fundamentado de
resistência ao software privativo de liberdade, o visitante observar
seu mentor e seus pares oferecendo e preferindo instalar software
privativo de liberdade, tenderá a se tornar mais um multiplicador da
contracultura do Software Livre.  Tampouco hesitará em instalar
distribuições com software privativo de liberdade, em decidir por
outros quais liberdades sacrificar e em se opor às sugestões e aos
pedidos de que futuros FLISOLis se comportem de forma compatível com o
Movimento Software Livre.  Com seu exemplo e atitude, propagará sua
resistência às nossas ideias, dificultando ainda mais a formação da
resistência ao software privativo de liberdade.

Muito menos importante que o software instalado é a mensagem
transmitida pelo FLISOL.  Porém, o software ofertado e instalado,
enquanto exemplos, são parte importantíssima da mensagem, pois quando
palavras e exemplos são contraditórios no ensino de valores, com maior
frequência prevalecem os exemplos.  Então, com que exemplos você vai
ensinar, no FLISOL da sua cidade, os valores e princípios do Movimento
Software Livre?  Com que exemplos vai reforçar a necessária e urgente
resistência ao software privativo de liberdade?  Como vai motivar o
FLISOL a adotar, como mais uma de suas regras internacionais, os bons
exemplos de resistência ao software privativo de liberdade, para que
deixe de minar nosso movimento e nossa resistência e se torne um
Festival Latinoamericano de Instalação de Software Livre Mesmo, um
FLISOL exemplar?


Copyright 2015 Alexandre Oliva

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